A aplicação do princípio da insignificância ao delito de
descaminho, nos casos em que os débitos tributários sejam menores que o
valor estipulado como parâmetro para a atuação do Estado em matéria de
execução fiscal, é considerada jurisprudência pacífica do Supremo
Tribunal Federal (STF). Com esse entendimento, o ministro Luís Roberto
Barroso deferiu o Habeas Corpus (HC) 122050 para restabelecer sentença
que absolveu sumariamente um réu denunciado pela suposta prática do
delito, descrito no artigo 334 do Código Penal. O pedido foi apresentado
na Corte pela Defensoria Pública da União.
Ao proferir a decisão, o ministro observou que, apesar de haver certa
uniformidade no STF nas condicionantes para a caracterização da
bagatela (mínima ofensividade da conduta do agente, ausência de
periculosidade social da ação, grau reduzido de reprovabilidade do
comportamento e inexpressividade da lesão jurídica provocada), não há um
enunciado claro e consistente que sinalize para as instâncias
inferiores o que o Tribunal considera suficiente para a utilização do
princípio da insignificância e possibilite, por consequência, afastar
aplicação da norma penal. Ressaltou que o resultado dessa falta de
uniformização é a ocorrência de julgamentos com resultados diversos para
fatos relativamente semelhantes.
O ministro salientou que essa disparidade não é observada nos casos
que tratam da aplicação do princípio da insignificância ao delito de
descaminho. Nessa circunstância, explicou, as decisões do STF têm sido
sempre mesmo sentido, pois o fundamento que orienta a avaliação da
tipicidade da conduta é o mesmo estipulado como parâmetro para a atuação
do Estado em matéria de execução fiscal, ou seja, o valor do tributo
devido. Destacou que, para aferir o requisito objetivo, assim como
estabelecido na legislação fiscal, o Tribunal considera a soma dos
débitos consolidados e, consequentemente, a reiteração na conduta.
No caso dos autos, um motorista, denunciado por suposta prática de
descaminho, em razão de transporte de mercadorias de origem estrangeira,
sem a internalização regular e frustrando o pagamento dos tributos, foi
absolvido sumariamente pelo Juízo de primeiro grau, que, aplicando o
princípio da insignificância, considerou atípica a supressão de
tributos, estipulados em R$ 17.554,35. O Ministério Público Federal
interpôs apelação, que foi desprovida pelo Tribunal Regional Federal da
4ª Região, sob a mesma fundamentação.
Em novo recurso, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que
não seria possível aplicar o princípio da insignificância porque o valor
do imposto devido teria ultrapassado o limite de R$ 10 mil para o não
ajuizamento da execução fiscal, valor previsto no artigo 20, da Lei
10.522/2002. O ministro Barroso assinalou, no entanto, que o Ministério
da Fazenda, por meio da Portaria 75/2012, definiu o valor de R$ 20 mil
como novo parâmetro para a atuação da Procuradoria da Fazenda Nacional e
para a análise das pretensões de natureza fiscal.
“Nessas condições, consideradas as diretrizes até então utilizadas
pelo Supremo Tribunal Federal na análise da tipicidade de condutas que
envolvem a importação irregular de mercadorias, não há como deixar de
reconhecer a atipicidade dos fatos imputados ao paciente. Notadamente se
se considerar que eventual desconforto com a via utilizada pelo
Estado-Administração para regular a sua atuação fiscal não é razão para a
exacerbação do poder punitivo”, concluiu o relator ao conceder o HC.
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